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11.15.2011

Um relato da morte



Bom, como posso começar? São tantas almas que tenho que pegar, de tantos indíviduos. Alguns vêm até mim, outros ficam parados me esperando. Mas há alguns que não querem me encontrar, fazem de tudo para fugir de mim. Saem correndo! Sabe quando você está prestes a perder o ônibus e tem que sair correndo para alcançá-lo? Não, não foi um bom exemplo. Sabe quando você vê um fantasma ou um monstro e sai correndo desesperado? Pois é, é o que eles fazem. Saem correndo tão rápido, tentando fugir de mim, até parece que viram uma assombração! Imaginem eu, a Morte, correndo atrás desses marmanjos. Insolentes!
E vocês não sabem o quão é difícil correr com essa roupa. Uma mão segurando a mortalha (para não tropeçar) e a outra segurando a foice. Me sinto patética fazendo isso, mas é meu trabalho. Aliás, esse trabalho é tão extenuante. Preciso de férias, ou arranjar outro emprego. Mas não encontro ninguém para me substituir. Imaginem só: marquei uma entrevista para os interessados pelo cargo. Havia bastante pessoas inscritas. Quando chamei o primeiro candidato, mandei-o fechar a porta da sala. Quando ele me viu, teve parada cardíaca e morreu. E nem era para ele morrer naquele momento. Peguei sua alma, chamei o próximo. Esse pelo menos não morreu: saiu correndo, com os braços para cima, feito um lunático. Chamei o próximo, quando disse que eu era a morte, ele começou a rir, falou que esperava mais de uma figura tão temida como eu. Tem uma coisa que detesto mais do que correr atrás das almas: quando riem de mim. Então ele não tinha tanto medo de mim agora que me conheceu? Pela minha foice, lá se foi mais um.
Bom, com o restante dos candidatos não foi muito diferente dos primeiros. Quase fui multada por excesso de almas naquele dia.
E naquele dia eu percebi: nunca teria folga. Então decidi: fiz um curso de lançamento de foice. Melhorei minha pontaria, não imaginam o quanto me foi útil: em vez de correr atrás das almas rebeldes, apenas lanço minha foice. E ainda vou desfilando com a minha linda mortalha para pegar aquela ingênua alma que pensou que poderia escapar de mim.
É bom que fique essa dica para você que está lendo: ninguém consegue escapar de mim. Aliás, tenho conversado muito com você, querido leitor, e isso nos aproxima. Nós, tão perto. Adivinhe o que isso significa...