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10.31.2011

Demônios da vida - Parte I

Ora, ora... mais uma vez eu estou aqui. Esse bar sujo, cheio de pessoas mal encaradas e o pior de tudo, fede. E como! Mas, sem saber o porquê, gosto desse lugar. Sinto como se eu pertencesse a esse ambiente, escuro e maligno. Gosto de sentar em um canto do bar, onde há apenas duas cadeiras e o local é muito mal iluminado. Sento em uma e apóio os pés na outra, enquanto aprecio minha dose de tekila nesse copo sujo com pedras irregulares de gelo.
Encontramos de tudo nesse lugar: bandidos, cornos, infelizes, ricos... bom, de tudo não, mas uma certa espécie de variedade. Mas todos acabam do mesmo jeito (exceto os ricos, que entram nesse bar para procurar alguém que lhes faça um serviço sujo): bêbados. Os bandidos mais espertos se mantêm sóbrios, duvido que seja por escolha. Já devem ser restistentes ao álcool.
E eu também fico sóbrio. Venho aqui tomar minha tekila enquanto observo as pessoas. E posso dizer uma coisa: nunca vi o barman de um jeito diferente. Sempre com a mesma roupa, a mesma expressão e a mesma voz de durão, uma figura poderosa. Dizem que, quando tentaram assaltar o bar, ele simplesmente conversou com os assaltantes, nada mais. E eles saíram correndo, como se estivessem visto o próprio demônio.
Sempre há um grupinho de bandidos bêbados zoando com a cara dos que entram no bar. Esses vivem bêbados, nem eu me atrevo a dizer a época que não falavam embolado. Na bancada, tentando conversar com o barman, sempre ficam os desiludidos com o amor, os cornos que mencionei. Bebem sem parar, choram sem parar, e, ou acabam apanhando, ou acabam dando o rabo pra um bandido qualquer. Cada um com sua escolha.
Se alguém entra de terno, todo arrumadinho, todos já sabem: lá vem serviço. Um assalto aqui, um homicídio ali, mas o pagamento é feito no momento do "contrato". Qual a garantia de que serviço será feito? Em papel, nenhuma. Mas, aqui, os bandidos mantêm a palavra. Se disseram que farão, então farão. Se um riquinho discute e fala que pagará metade do serviço no começo e a outra metade quando o serviço estivesse pronto, todos já sabem que ele é novo nos negócios. A primeira pergunta é: quem indicou esse lugar a você? Apesar de ele relutar em responder, acaba entregando todas as respostas. Novatos riquinhos, inocentes e patéticos.
E é dessa forma que o bar vive, com esses tipos de pessoas, com esse tipo de clima, com ar convidativo e violento. É daqui que saem as mais diversas histórias, e uma delas contarei a vocês. Uma história de um garotinho que queria ajudar sua irmã, e para isso precisava da ajuda do pessoal mais criminoso desse bar.
Mas não lhes contarei agora. Terminarei minha dose de tekila primeiro.

10.12.2011

Infância



 Não dizem que sou louco porque sou apenas uma criança. Dizem que faz parte dessa fase e que logo passa, mas eu não quero que passe. É tão bom ter amigos, principalmente aqueles que sempre estão disponíveis para conversar, ou pelo menos ficar olhando para sua cara durante horas, quando você mais precisa. Apenas a presença é suficiente.
Sabe aquelas vezes que a gente acorda no meio da noite e o sono vai embora e você fica morrendo de vontade de conversar com alguém porque aquele silêncio vazio do quarto é entediante? Os pais estão dormindo e você está sozinho na madrugada... então eu sento no parapeito da janela e olho para o céu e vejo que não estou sozinho. Vejo minha amiga, a lua, que a cada semana está de um jeito diferente: gordinha, sorrindo, crescendo ou ficando fininha. E começamos a conversar, eu aqui e ela lá. Eu falo e ela me responde! Conversamos sobre como foi o dia: eu conto como foi aqui e ela me conta como foi do outro lado do mundo. Discutimos sobre brincadeiras, histórias reais e fantásticas, sobre sonhos e pesadelos... ou ficamos apenas olhando um para o outro, ou para as estrelas, para os outros planetas e, de vez em quando, um cometa passeia pelo céu, o que rende bons assuntos... e nós ficamos juntos durante toda a noite até a hora que me dá vontade de dormir de novo. De vez em quando, um de meus pais acorda e vê a gente conversando, mas eles pensam que é só uma fase da infância.
E ela esteve sempre lá, em todas as madrugadas, conversando comigo. Mesmo quando o céu estava cheio de nuvens e eu não conseguia vê-la, ela me respondia e eu sabia que estava lá.
Não sei quantas noites passei com ela ao meu lado, só sei que hoje ela não conversa somente comigo, mas também com meu filho, que senta no parapeito da janela ao meu lado. E a conversa se desenrola com nós três, até ele adormecer. Às vezes ainda fico um pouco mais com minha velha amiga. Coloco o júnior na cama, olho pela janela e ela dá uma piscadela. Eu retribuo e vou dormir.
Eu sabia que não era apenas uma fase, porque amizade assim não acaba. "Apenas uma fase da infância!" Não é preciso de fase nenhuma para se ter uma amizade como essa!

E sabe por quê? Porque ser criança não tem idade, essa fase nunca passa!

Douglas Mateus

Esse texto foi em homenagem à todas as crianças e à todas as pessoas que não deixaram essa fase para trás.
Feliz Dia das Crianças!